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Bola Perdida

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Para Luiz Carlos dos Santos, o Lucas, Glauco Villas Boas e Isabella Nardoni.

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“Você possui apenas aquilo que não perderá com a morte; tudo o mais é ilusão.”

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“Existem três tipos de pessoas muito difíceis de se conviver: as que se preocupam até a morte, as que trabalham até morrer e as que se aborrecem até a morte.”

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“O homem fraco teme a morte, o desgraçado a chama; o valente a procura. Só o sensato a espera.”

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“Nessa vida onde os valores mais respeitados são em dinheiro, nada é certo, além da morte, das faturas a pagar, de uma porção de inutilidades ocupando espaço e dos impostos.”

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Meus vivíssimos leitores, a morte é uma ilusão de ótica e acústica que começa no instante em que alguém desiste de aprender. Mas é sempre bom lembrar que o que não provoca nossa morte faz com que fiquemos mais fortes e mais vivos do que nunca. E pelo que a gente sabe o objetivo da vida é criar as melhores defesas possíveis contra a morte. O que não dá pra entender, de jeito nenhum,  é que todos querem ir para o céu, mas ninguém quer morrer. Claro, pois se morrer fosse tão bom assim, os deuses não seriam imortais. Não é mesmo? O que eu quero mesmo lhes dizer é que a morte sempre me prega sustos. Principalmente quando acontece com alguém tão próximo que até parece que sou eu que estou indo pra fita. Mas isso não tem importância.

Os falacianos adoram fazer papel de palhaço.

– Ah, não. Essa não, mas de jeito nenhum. Lição de moral pra cima de mim, satanás de fundo de quintal? Vai querer dar uma de que está acima do bem e do mal?, aqui, ó! Só no dia que você aparecer de terninho, camisa, gravata e sapatinhos novos, né, Ribamar?…Ahahahahahahah….

– Verdade, Geraldo. Ninguém agüenta ver a mesma pessoa, com a mesma empáfia e com a mesma roupa há mais de 10 anos. E o que é pior: usando o perfume “Naftalina Dior”! Cristo do Céu, que bodum! Ahahahahahah…

Não lhe deem ouvidos, meus atentíssimos leitores. Não sei se já disse a vocês que a pilhéria, o chiste, a bazófia são armas de baixo calibre a serviço dos pobres de espírito.

Geraldo, como vocês sabem, fornica com a própria alma. Tem uma enorme inveja de meu doce estilo novo e de minhas tiradas rocambolescas. Vive a plagiar-me e a utilizar minhas piruetas estilísticas como se suas fossem. E o Ribamar então? O que dizer de um ser que tem o rosto sobre uma superfície mais esburacada que a superfície da lua? Ou melhor, que tem o rosto numa espinha? Dirão meus leitores mais apressados; “O Dalton é uma bola, vive a fazer uso de hipérboles.” Nada, meus apressadíssimos leitores, puro eufemismo!

– Olha só, Riba! O cara está completamente perdido…ahahaha… acha que vão entender…eufemismo… ahahahah….que figura!

Os dois abraçados saem para fumar, mas não sem antes arrancar a página em que estou escrevendo e jogar no lixo. Mas isso não tem importância.

É mais fácil um pobre passar pelo buraco de uma agulha do que um camelo entrar no céu.

Não sei se já disse isso a vocês, mas se não disse, digo-o agora, a vergonha que eu sentia  por viver em precaríssimas condições financeiras fez de mim um humilhado. Nasci pobre, me criei pobre e até hoje vivo franciscanamente. Na verdade sou inadimplente até para pagar flexões, pecados ou promessas. É quase um sofrer atávico. Lembrem-se que convivo com as mais cavas e profundas humilhações desde que, aos 9 anos, comprei fiado o meu primeiro picolé de manga na banquinha da dona Clara. O certo é que se fossem contabilizados os juros e as trocas de moeda, hoje eu deveria um estoque inteiro da Casa da Moeda para a minha primeira credora, que morreu sem ver um tostão de minha parte. Mas menti e já me corrijo. Eu não tinha ainda 9 e, sim,  6 anos e não era um picolé de manga, mas uma viscosa, plástica e erótica maria-mole, de lamber os dedos e o papel para recolher até o último resquício do coco que a envolvia. E também não era nenhuma banquinha, mas o aconchegantíssimo e bem abastecido armazém do seo Boleslau, o único, verdadeiro e insubstituível polaco da nhanha. De lá pra cá, minha vida é um complicado exercício de postergação de dívidas e, confesso a vocês, todo esse malabarismo ficcional para acalmar lombrigas de cobradores deu ao meu estilo um colorido muito especial. Diria até que sou escritor graças a esses arautos do NÃO DEVA NADA A NINGUÉM, que chegam, muita vez, a me fazer várias ligações no  mesmo dia só para ouvir minhas escarpadas e inescaláveis montanhas de desculpas, chegando mesmo a aplaudir e pedir bis a algumas passagens mais criativas. Morrem de rir, mas isso não tem importância

A morte é tão natural que todos deveriam encará-la apenas como mais uma cama.

Meus esclarecidíssimos leitores,  se existe alguma diferença entre sexo e morte, só pode ser pelo fato de que morrer você faz sozinho e sexo obrigatoriamente acompanhado de alguém ou recebendo uma mãozinha. Mas por que estou falando nisso? Ah, lembrei.  Na minha doce e querida infância, que os anos não trazem mais, como diria Casimiro de Abreu, já havia em mim certa nostalgia do futuro. O assunto preferido das mulheres do simplório e entusiástico bairro Campina do Siqueira era a traição. O sexo atrás das cortinas, nos matinhos, no banco de trás dos automóveis, no quartinho dos fundos com as empregadas. Havia um moralismo fatídico, um certo fanatismo ideológico e religioso que, normalmente, levavam os finais dessas histórias à morte. Ou como todos repetiam: à lavagem da honra. O amor era um assunto de somenos importância. Mas foi exatamente essa distância entre o amor e o sexo que encalacrou em meu cérebro ainda em formação as duas primeiras grandes dúvidas: Fazer sexo é o mesmo que dar milho às galinhas? Morrer é apenas amputar o corpo da alma? E foi assim, meus contemporaníssimos leitores, sabendo que ninguém pode fugir do amor e nem da morte, que eu cheguei até vocês. Mas isso não tem importância.

O vampiro deu o sangue por nós, com picardia.

Dona Zenóbia, minha doce esposa, me dizia que a morte de uma pessoa é uma tragédia; a de milhões, apenas estatística, quando o Trevisan, chegou lá em casa. De relance, com seu olhar de lince, avistou a travessa de broinhas de fubá mimoso e,  estrategicamente,  se posicionou, para num gesto simples e exato, levar o ato de papá-las ao limite do bom senso. Súbito, alçou voo até o litro de licor de ovos e, em goles inquestionáveis, sorveu até a última gota, só então descascou:

– Que tal O MANÍACO DO OLHO VERDE, Dalton?*

– De morte, Trevisan!

– Teu tio, o Torcedor, me negou todo e qualquer comentário sobre o livro.

– E que importância tem a opinião dele? Nem você sabe. Só te digo uma coisa, para avaliar a importância real de uma pessoa, devemos refletir sobre os efeitos que sua morte produziria em nós, nas pessoas em sua volta e na cidade em que ela vive, pois quando morremos, deixamos para trás tudo que possuímos e levamos somente o que somos.

– É, é bem por aí mesmo. Mas é das pessoas que a gente gosta, que dá gosto de ouvir a opinião, em alto e bom som, ao vivo. Não acredito em vida após a morte, por isso não preciso passar toda minha vida temendo o inferno, ou temendo o céu mais ainda. Por piores que sejam as torturas do inferno, penso que a chatice do céu seria insuportavelmente pior, cara.

– Ah, Trevisan, vai, sossega o facho! E o Torcedor ainda está naquela de crente que tá agradando?

– Não larga mais a Bíblia, nem com reza braba. Hehehehe…

– Ahahahaha… Essa foi boa. Quarta-feira fui visitá-lo, nem me olhou na cara. Parecia hipnotizado, vendo e ouvindo aquelas baboseiras do vendilhão-mor do templo, o bispo Edir Macedo.

– Esse fala mais que o homem da cobra, né?

– É, mas se macaco velho não põe a mão em galho podre, como é que o Torcedor foi cair nessa?

– Tudo culpa dos outros. A Gertrudes…

– Aquela enfermeira boazuda, tratada à pizza e rocambole, que fazia meu tio salivar ao relembrar os dias de bole-bole?

– Ela mesma, bastou uma chave de buça pra fechar pra sempre a porta da lucidez do velho.

– Só Deus sabe se pra sempre… Mas, me conte, trouxe a mensagem que o Machado de Assis enviou via terreiro do Pai Veio Chico Fantasma?

– Não tive tempo, tua mãe pediu pra eu afogar o ganso e eu o fiz, com picardia.

– Você não se cansa dessas brincadeirinhas infames?

– Infames são essas perguntas idiotas que você faz. Claro que trouxe. Tome! Mas o Chico Fantasma reiterou diversas vezes que é para você abrir só quando ouvir o primeiro uivo, após a hora que apavora.

– Sei lá, Trevisan, às vezes, penso que todo esse misticismo não passa de uma grande…

Sai e não diz nem tchau. Dona Zenóbia volta com uma nova fornada de broinhas e um litro cheinho, me beija e se retira para dormir. Eu, trêmulo de emoção, com o envelope nas mãos, bebendo e fumando espero. Mas isso não tem importância.

O Roberto Prado é tão genial que me deixa burro da idéia.

Eram 5h34 da manhã quando o telefone tocou pela terceira vez. Mas não foi ele e sim Dona Zenóbia quem me acordou, com o seu muxoxo encantador. Com a precisão de um gato e a velocidade de um guepardo saltei da cama e, sussurrando, atendi:

– Fala, Becão!

– Você não erra uma?

– É que a probabilidade de ser outra pessoa era de uma para quase 7 bilhões.

– Jogue na loteria, é batata! Mas, mudando de assunto, que bom que vocês não estavam dormindo.

– A essa hora? Imagine, Pradinho! Eu e Dona Zenóbia oferecemos a nossa casa para os ensaios do bloco Rancho das Flores, para o carnaval 2011. Hoje é o dia do ensaio da bateria, já viu, né? A vizinhança, desde a meia-noite, solta fogos de artifício. Dona Zenóbia agora até está a espiar pelos furos que surgiram em nossas paredes.

– Ah, que bom, nada como um pouco de ar fresco, quando se está fazendo algum tipo de exercício.

– Sei, sei, Mas diga lá, o que é que manda, Roberto?

– Os prazeres são os primeiros que morrem; em seguida  nossos temores e vaidades; por último, nossas esperanças. E, então, nosso tempo acaba. O pó cobra sua essência e a ele retornamos. Não é isso que você acha?

Com o olho rútilo e trêmulo, vejo ali algo que nunca vi. Uma estranha inquietação faz com que meus lábios se contraiam e um acentuado esgar no canto da boca me sinaliza o perigo de uma resposta impensada. Mas vou que vou:

– A velhice pode ser o nosso tempo de maior ventura, Beco. O animal pode estar quase morto, mas restam o homem e a alma.

– Não lhe parece uma grande sandice nascer para morrer sem saber por que nem quando nem onde? Ou vai querer dizer que não pensou sobre o assunto?

O esgar agora é sucedido por uma baba elástica, paquidérmica, que cai sobre o pijama dando-lhe a aparência mórbida dos pijamas de sanatório. E, cauteloso, permaneço em silêncio.

– Quem cala consente, Dalton. Uma pena que a certeza da morte tenha menos influência sobre a nossa conduta do que seria de esperar. Talvez porque a morte não tenha mais segredos que a vida pra nos revelar. O que me diz?

Confesso que tremi. A hecatômbica afirmação seguida da fulminante e emblemática pergunta desperta em meu íntimo as mais atávicas e anacrônicas ânsias de preservação.  Intimidado, arrisco:

– Beco, você há de convir que é muito mais fácil suportar a morte sem pensar nela do que suportar o pensamento da morte e continuar a viver. Eu, por exemplo, nunca mais quero morrer de amor e sobreviver.

– Encarar a morte calmamente, em paz, só é meritório para quem está nessa sozinho. Dando a cara pra bater as botas. Se os mortos pudessem ler os epitáfios que seus herdeiros lhes consagraram, a grande maioria iria achar que foram colocados na tumba errada.

A clarividência exata da afirmação me faz engolir em seco toda a aridez salgada do Atacama, mas num último solavanco tento ainda uma saída:

– Bmasz, Vieko, boce nomm… Desliga e não me deseja nem bom-dia, o desgracido. Fico na varanda e os primeiros raios de sol enchem de luz meus pensamentos e todo meu ser relaxa e desmorona preguiçosamente sobre a poltrona. Luz, mais luz! Nem Goethe diria melhor. Mas isso não tem importância.

O reacionário volta a atacar.

Meus sobreviventíssimos leitores, a verdade é que quando a morte chega inexoravelmente, parece que as pessoas ficam em irresistível e fecunda paz de espírito. Param de lutar contra essa fatalidade e se entregam à morte com uma docilidade quase incompreensível, quase irracional. Mas não é isso que eu queria lhes dizer e, sim, que  no dia 2 de maio de 1969, encontrei Nelson Rodrigues às margens plácidas da Lagoa Rodrigo de Freitas. A noite estava tranqüila e sentamos à mesa de uma das barracas existentes, para comer peixe frito e tomar água de coco. Não sei por que cargas d’água falávamos sobre a morte e eu repetia para o Nelson as últimas palavras de Thomas Hobbes: “Estou prestes a iniciar minha última viagem, um salto terrível no escuro.”

Nelson, então, começou a me contar sobre a insensibilidade de certas pessoas diante desse trágico acontecimento ou de situações similares. E citava, como exemplo, as estágiárias dos grandes jornais, às quais se referia como apavorantes seres telefônicos, capazes de entrevistar o servente, o ministro, o batedor de carteira, o presidente, com o mesmíssimo élan, alegre e medonho. Dizia-me ele ao pé do ouvido:

“Dalton, um dos nossos maiores jornais mandou a estagiária ouvir um milionário paulista. Como o homem tinha apartamento no Rio, foi fácil. A menina não pensou duas vezes. Discou. Mas houve a coincidência:- dez minutos antes o industrial tivera  um infarto brutalíssimo, quase fulminante. Não se sabe como o Hospital do Coração, com diretoria, médicos, enfermeiras, equipamentos, medicamentos e tudo mais, já estavam lá. Sob a máscara de oxigênio, o doente tinha o olho enorme e fixo do terror. O chefe da junta médica já cochichara ao demais: – “Grave.” Perguntaram em uníssono: – “Tanto assim?” Gravemente, sublinhou: – “Muito grave.” Foi neste momento de estrebuchamento que o telefone tocou. E o filho se arremessou: – “Alô, alô!” E a estagiária: – “É da residência do senhor Miguel Sanches Albuquerque? Aqui é do jornal O Globo, poderia chamá-lo?”

O rapaz explica, baixinho e espavorido: – “Minha senhora, papai teve um infarto, acaba de ter um infarto.” A outra não se deu por achada: – “Então quer me fazer o favor? Vai lá e pergunta o que é que ele acha da pílula.” O filho, aterrado, balbuciou: – “Mas papai teve um infarto!” E a estagiária: – “Eu espero.” O filho começou a duvidar até do telefonema. Chegou a admitir que não estava falando com ninguém nem ouvindo ninguém, e que era vítima de uma espantosa alucinação. Todavia, no desespero, repetiu: – “Minha senhora, eu estou lhe dizendo que papai teve um infarto. Está morrendo. Ouviu bem, minha senhora?” O outro lado da linha lhe dizia: – “Sei, sei. Estou ouvindo. Mas o senhor não pode me fazer esse favorzinho? Basta uma frase sobre a pílula.”

Por fim, o filho tomou-se de um ódio nunca visto: – “Escuta bem, minha senhora, se eu estivesse aí ou a senhora aqui, eu lhe dava um soco. Pela vida do meu pai, que está morrendo. Dava-lhe um soco bem no meio da cara.”

Rimos, como duas grandes almas riem para não chorar diante das tragédias do cotidiano. E Nelson ainda saiu-se com essa, após o abraço que nos separava. Virou-se e proferiu: – “Hoje, o homem de bem é um cadáver mal informado, ainda não sabe que morreu.” Diante da seriedade de seu olhar; meio sem graça, ri mais uma vez. Mas isso não tem importância.

O campeonato paranaense é mesmo uma bola!

Terminada a primeira fase, o paranaense 2010, acabou como começou a primeira rodada, sem emoção, sem público, sem vergonha de ser infeliz. O supermando ficou mesmo com o Coritiba, que joga as 7 últimas partidas em casa e ainda leva um bônus de 2 pontos. O Atlético quase repete a dose, joga 6 em casa e leva um ponto extra. O resto leva pontapé na bunda, um tremendo prejuízo no caixa e um tempão para se deslocar de estádio em estádio. E o que é pior deixam a torcida em casa assistindo aos jogões do campeonato paulista e carioca. Que meleca!

O Coritiba jogou a primeira das sete contra o Paraná e a segunda contra o Malucelli, vulgo, Curíntias Paranaense. Duas goleadas inquestionáveis: 1×0 e 2×1, com direito a olé, cachorro quente, bife com pão e gasosa cini. O matador Ariel, que andava meio degringolado, entrou nos finais das duas partidas e enfiou uma fieira de gols, um mais lindo do que o outro. Segundo o Chico Fantasma, que, há 4 séculos, é um espírito que caga e anda, está pintando o campeão da série B 2010.

O Atlético ganhou com as calças na mão seus dois primeiros desafios. Os placares magros de 4×1 contra o Malucelli e 5×0 contra o Cascavel espelham bem as dificuldades que encontrou pela frente. Dizem que fez o que fez nestes dois jogos só de inveja, porque está atrás do Coritiba na classificação. O Maringas jura que é verdade, a Bárbara Kirschner diz que é necessário separar a joia da  intriga. E o Ivan leva a Gianna para jantar à luz de vela, porque não quer nem saber de lanterna.

O Paraná depois de ser goleado inapelavelmente por 1×0 pelo Coritiba, tirou todos os traumas em cima do Paranavaí. Na base da raça, da empolgação e quase futebol nenhum, ganhou com o placar apertadíssimo de 4×1. O poeta Batista de Pilar não sabe se escreve ou se se apaixona por alguma Salomé que lhe faça perder a cabeça. Mas isso não tem importância.

A morte não avisa sua chegada com trombetas, tambores e fogos de artifício.

Ayrton Senna, que essa semana faria 50 anos, disse certa feita numa entrevista: “O dia que a morte chegar, chegou. Pode ser hoje ou daqui a 50 anos. A única coisa certa é que ela vai chegar.” Sábias palavras de alguém que era inteligente e sensível até sentado dentro de um fórmula 1. Mas não era isso o que eu queria lhes dizer, e, sim, que ao abrir o envelope logo após a meia-noite e o primeiro uivo da madrugada, dei com os dedos numa textura muito fina, muito agradável ao toque, uma coisa assim quase seda, quase nuvem, quase nada. Um papel carta como eu nunca havia visto, de uma brancura e pureza tão incorruptíveis, que cheguei mesmo a duvidar que cuidava tê-lo nas mãos.

Nele, em letras econômicas e elegantemente grafadas, Machado descasca todo o tema da crônica de hoje: “O homem não morre quando deixa de viver, mas quando deixa de amar.” A frase, ao mesmo tempo, lapidar e contundente, meus curiosíssimos leitores, jogou-me uma verdade inapelável na cara. Fez-me ver  que estou vivo e que passei os últimos dias escrevendo e compondo. E de repente, não mais que de repente, me veio ao peito uma saudade absurda de Dona Zenóbia, minha doce esposa. Então vejo claramente que jamais deixei de amá-la e seu abraço foi, é e será sempre meu eterno refúgio. Poupem-me, pois a morte a dois não é morte, nem mesmo para os céticos.

Até a próxima.

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Dalton Machado Rodrigues

daltonmrodrigues@gmail.com

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* Livro mais recente de Dalton Trevisan

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~ por polacodabarreirinha em 29/03/2010.

3 Respostas to “”

  1. Li, reli, li de novo e de novo. Uma beleza mortal, que me doeu maravilhosamente. Beijo enorme.

  2. Thadeu:

    fiquei PENALIZADO
    com as derrotas de coxinhas e paranitos
    na Copa do Brasil…
    Resovi PEGAR uma caneta no meu PENAL
    e escrever uma elegia aos dois, tadinhos,
    nesse momento de PENALIDADE MÁXIMA
    e com FALTAS tão GRAVES,
    mas fiquei como um PÊNALTI: PERDIDO,
    e a minha rima BATEU NA TRAVE!

  3. Meu carissíssimo Ivan, perder não é tudo na vida, há em mim uma contingência muito mais imediata de ser coxa e não sentir se tenho ou não ainda uma alma. A torcida que nunca abandona era uma falácia. A império ruiu, mas no seu egoísmo teria que destruir o que a construiu. Uma realidade de sonhos e glórias foi transformada num pesadelo de egos e vendilhões do templo. Sou coxa, continuarei coxa, eternamente coxa, mas ultimamente me sinto coxo, asa quebrada, incapaz de sofrer.

    Dalton Machado Rodrigues

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