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Gregório de Matos, o Boca de Inferno, em meados do século XVII, escreveu este poema definindo a sua Bahia. O retrato parece ter sido tirado agorinha de qualquer cidade brasileira. Curitiba cai como uma luva dentro desta definição.
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Se de dous ff composta está a nossa Bahia,
errada a ortografia, a grande dano está posta:
eu quero fazer aposta e quero um tostão perder,
que isso a há de perverter, se o furtar e o foder bem
não são os ff que tem esta cidade ao meu ver.
Provo a conjetura já, prontamente como um brinco:
Bahia tem letras cinco que são B-A-H-I-A:
logo ninguém me dirá que dous ff chega a ter,
pois nenhum contém sequer, salvo se em boa verdade
são os ff da cidade um furtar, outro foder.
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E que justiça a resguarda?………….Bastarda
É grátis distribuída?………………….Vendida
Que tem, que a todos assusta?…….Injusta.
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Valha-nos Deus, o que custa,
o que El-Rei nos dá de graça,
que anda a justiça na praça
Bastarda, Vendida, Injusta.
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Que vai pela clerezia?………………Simonia
E pelos membros da Igreja?……….Inveja
Cuidei, que mais se lhe punha?…..Unha.
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Sazonada caramunha!
enfim que na Santa Sé
o que se pratica, é
Simonia, Inveja, Unha.
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E nos frades há manqueiras?………Freiras
Em que ocupam os serões?…………Sermões
Não se ocupam em disputas?………Putas.
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Com palavras dissolutas me concluís na verdade,
que as lidas todas de um Frade
são Freiras, Sermões, e Putas.
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O açúcar já se acabou?………………Baixou
E o dinheiro se extinguiu?………….Subiu
Logo já convalesceu?…………………Morreu.
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À Bahia aconteceu o que a um doente acontece,
cai na cama, o mal lhe cresce,
Baixou, subiu e morreu.
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A Câmara não acode?……………….Não pode
Pois não tem todo o poder?………..Não quer
É que o governo a convence?……..Não vence.
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Que haverá que tal pense,
que uma Câmara tão nobre
por ver-se mísera, e pobre
não pode, não quer, não vence.
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